quinta-feira, 1 de outubro de 2009

Sacanas sem Lei


Há, hoje, poucos cineastas que consigam combinar tão bem qualidade com consistência. A obra de Tarantino é toda ela pautada por uma consistência na forma e uma regularidade na qualidade. Mesmo tendo Pulp Fiction granjeado o título de filme de culto, é difícil estratificar a sua obra, quer pela positiva quer pela negativa. Nesse sentido, Sacanas sem Lei rege-se pelas mesmas regras de filmes como Pulp Fiction, Kill Bill ou Death Proof. Acontece em vários aspectos - nos diálogos, na presença do onírico e do surreal, no ritmo - mas o mais notório, o que se torna o centro deste filme, é a paixão pelo cinema. Tarantino tornou-se um compositor único que cunha cada obra com pormenores muito pessoais. Podemos facilmente ver um filme de Tarantino, não o sabendo, e adivinhar o autor. Mas, para além da pessoalidade que empresta às suas obras, é o seu absoluto amor pelo cinema que mais salta à vista. Mais que amor, paixão. É evidente também o profundo conhecedor que é, mas é a vontade de filmar que mais impressiona.
Saltar daí para Sacanas sem Lei é quase lógico. Toda a obra de Tarantino tem sido uma enorme homenagem ao cinema. A sua mente acumulou os milhares de filmes que viu e estudou e cospe-nos agora aqueles que achou merecerem homenagem. É um exercício complicado descobrir referências cinematográficas nos seus vários filmes, e em especial neste último. Mas diverte ainda mais reparar como o seu gosto é eclético e como as suas obras são universais. Até o seu bom cinema lembra por vezes o mau cinema de outros. A mudança de linguagem num diálogo e o rigor absurdo até com o sotaque lembram o tropeção clássico dos filmes de guerra passados em 2 ou 3 países mas onde toda a gente fala a mesma lingua. Mas não só esta homenagem não se baseia em pormenores como não é algo intelectualizado. Sacanas sem Lei é filme de antologia na obra de Tarantino porque nele inclui pedaços de todos os seus filmes (o nome de Hugo Stirling em letras garrafais lembra a estética de Death Proof, os diálogos são à Pulp Fiction e as cenas sanguinárias têm a irrealidade do sangue esguichado em Kill Billq) e porque simplifica este amor ao cinema ao máximo. É sobre o poder do cinema que falamos. Sobre como o cinema é a salvação do homem. Com Tarantino, o fim da guerra dá-se no cinema, a ficcionada morte de Hitler dá-se pelo cinema, no cinema. No cinema, enquanto espaço físico, e pelo cinema, enquanto filme e fita. É o amor pelo cinema de bobine, o amor pelas salas de cinema, o amor pelo filme. No fim, o cinema salva o mundo.

Título: Sacanas sem Lei
Realizador: Quentin Tarantino
Elenco: Brad Pitt, Mike Myers, Christoph Waltz, Samm Levine, Eli Roth, Diane Kruger e Samuel L. Jackson (voz).
E.U.A., 2009.
Nota: 8/10

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