Portugal, Um Retrato Social

A determinada altura dos últimos anos, por uma altura que não sei precisar muito bem, Rodrigo Leão tornou-se um caso estranho da música portuguesa. Sumariamente, tornou-se num músico incapaz de fazer música má, razoável ou razoavelmente boa. Não, Rodrigo Leão, desconheço se por defeito ou feitio, só consegue produzir música de elevada qualidade e de uma pertinência extrema. Fê-lo com Alma Mater e fê-lo com Cinema. Tem vindo a fazê-lo desde os tempos dos Sétima Legião, ainda mais nos tempos dos Madredeus – onde o seu toque de Midas, por comparação, sabemos hoje distinguir.

Se com Cinema, um monumental trabalho – aliás galardoado por revistas como a Billboard – se revelava uma espécie de Ennio Morricone, demostrando a internacionalização do seu trabalho; com o seu novo álbum vem relembrar-nos a sua indubitável origem. Cinema era a banda sonora de um filme por acontecer e, na súmula das inesquecíveis participações que continha, revelava-se um trabalho de extremo puro entre as influências do mestre italiano, a canção francesa e o melhor que os Madredeus tinham desenvolvido, criando melodias de grande beleza e sentimento. Portugal, Um Retrato Social, o seu mais recente trabalho, mostra a sua capacidade de recriar e de nos surpreender.

Banda sonora encomendada por António Barreto para a série de televisão homónima, Portugal, Um Retrato Social é um trabalho menos produzido que o anterior. É uma trabalho mais simples, mais genuíno, mais português. É também, mas não por isso, um trabalho ligeiramente menor. A toada é a mesma mas sente-se falta de algum ímpeto, de uma visceralidade que quer Cinema quer Alma Mater continham. O que existe é a capacidade de perceber a essência da ser português e transpô-la não para um poema, o que seria o mais comum, mas para uma melodia. Aí, na dissecção dos sentimentos que são os nossos, Portugal, Um Retrato Social revela-se um trabalho dos melhores da carreira de Rodrigo Leão, ao nível de alguns trabalhos dos Madredeus.

Um total de 18 músicas onde os nomes nos direccionam para um ambiente que facilmente alcançamos. Cada lugar tem o seu temperamento. Como as discussões que se ouvem em “O Café dos Emigrantes”. Ou a multietnicidade de “Gente Diferente”. Ou o cheiro a manhã cedo de “A Escola”. Ou ainda o sabor a África de “Nós e os Outros”. É bom saber que há em Portugal quem perceba o seu pais. Mas melhor ainda é saber que há quem consiga reproduzi-lo. Se Portugal, Um Retrato Social, a série, é um bom retrato do país que somos, em muito o deve, também, a este álbum.

Título: Portugal, Um Retrato Social
Autor: Rodrigo Leão

Nota: 7/10