sexta-feira, 9 de novembro de 2007

O Mistério do Cão de Chapeleira


O Grupo de Teatro ExCena leva a cena, de 2 a 11 de Novembro, a peça de Álvaro Cordeiro, O Mistério do Cão de Chapeleira. Este é um grupo de Teatro cuja regularidade, quer exibicional quer temporal, tem criado, no Teatro Passagem de Nível, em Alfornelos, uma atracção e uma referência nessa área de difícil execução que é o Teatro Amador. Contudo, se espera mais uma peça nos costumeiros meandros a que o autor nos habituou, desengane-se. Em O Mistério do Cão de Chapeleira não existem procedimentos morais nem protocolos sociais. Existe uma recriação livre de um ambiente detectivesco com recortes históricos.

Este ponto, a recriação do autor, será porventura um dos pontos fortes da peça. Não que esta seja uma das melhores peças de Álvaro Cordeiro, porque o não é; nem que seja uma peça unânime. Mas é, e tal saúda-se, uma viragem profunda no que à sua obra diz respeito. Uma lufada de ar fresco que, mais ou menos conseguida, e com mais ou menos sequência na sua obra, cai bem. Uma peça leve, despreocupada e despretensiosa, com mais de entretenimento que de pretensão artística, mas que por isso mesmo se satisfaz.

O Mistério do Cão de Chapeleira remonta-nos para a época envolvente à candidatura de Humberto Delgado à Presidência da República. Intrigas amorosas e romances pessoais mal resolvidos misturam-se com um detective característico e um PIDE recambolesco, sempre com a situação politica como pano de fundo e um ambiente que vagueia entre o suspense policial e a sátira a esse mesmo género. Com música eficiente de José Dias e cenários que em nada envergonhariam muitos teatros profissionais.

Mas, com franqueza, raramente nos esquecemos que vemos teatro amador. Se é verdade que as duas personagens masculinas – interpetadas por Diogo Alexandre e Miguel Almeida – mantêm elevada a fasquia e elevam as suas personagens ao máximo, o mesmo não se poderá dizer das duas representantes femininas, paradigma do amadorismo mais básico e patente. É, aliás, desta profunda e marcada desigualdade que nasce a fraqueza da peça. Porque, se por um lado o seu enredo nem sempre se torna apelativo, por outro as personagens são de um fino recorte e individualização, o que, a priori, permitiria extrair delas bons desempenhos.

Ficamos assim sem saber se, com outras protagonistas, o resultado não poderia ser outro. Sem as assimetrias e desigualdades que em tudo prejudicam a peça. A própria encenação, experiente e eficaz, revela ela mesma essa dualidade. Com os actores masculinos percebe-se um encenador que concede liberdade e efectua pequenas correcções, enquanto que com o elenco feminino se nota claramente a necessidade que houve em funcionar como director de actores, com óbvio prejuízo para a personagem. São, contudo, estes os meandros do teatro amador português. Mas este será tanto o seu ponto forte como o seu calcanhar de Aquiles.

Título: O Mistério do Cão de Chapeleira
Autor: Álvaro Cordeiro
Encenador: Paulo Vaz
Elenco: Diogo Alexandre, Miguel Almeida, Ana Correia e Catarina Duque.

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