terça-feira, 9 de outubro de 2007

Planeta Terror

Originalmente pensados como uma sequência de conjunto, a que Rodriguez e Tarantino chamaram Grindhouse, para o público europeu o projecto foi dividido em dois filmes a ser apresentados separadamente. Primeiro Á prova de morte, de Tarantino, e, agora, Planeta Terror, de Rodriguez. A razão primária para esta separação terá sido o insucesso comercial de Grindhouse no país natal, mas ninguém sinceramente acredita que a dupla de realizadores tenha ido adiante com o projecto por alguma razão que não puro prazer fetichista e como oportunidade de homenagear um cinema em vias de extinção. Mas, dinheito à parte, esta separação traz uma inevitável comparação entre os dois filmes, já que ambos jogam no ambiente gore de filme série-B. Muita acção, maquinaria e tiroteios, mulherio avulso e história repleta de incoerências tapadas com argamassa visual.

Muitas comparações se fizeram entre os dois filmes (especial atenção para a de Jorge Mourinha), mas, prefiram-se pricopatas de meia-noite ou zombies de credibilidade reduzida, a verdade é que Rodriguez transporta melhor o ambiente dos filmes que homenageia para o público que o vê a si, Rodriguez. Nisso, a sua versão é melhor. Nenhum dos dois almejava fazer um grande filme (isso já o fizeram ambos). Desejavam apenas recriar esse ambiente que moldou a sua infância e adolescência, que viam morrer, ser enxovalhado e mal compreendido. Nesse sentido, o trabalho está feito. Ninguém jamais ignorará os filmes de zombies.

Planeta Terror percebe-se desde o princípio. Pelo título, súmula de mau gosto, que para o caso interessa sobremaneira; e pelo trailer que o antecede, Machete. Machete, que seria um interessantíssimo filme série-B, é um trailer que resume em si a essência do género e demonstra um sentido de humor e uma capacidade de gozar com o próprio género que se homenageia, que nos preparam para a sucessão de clichés a que vamos assistir. A qual, pela primeira vez, é bem-vinda. De Planeta Terror podemos dizer que é pior que o melhor filme do género, e isso faz dele um grande filme. Consciente da sua desgraça, convicto na sua incoerência, permanente na fidelidade.

Esse é o grande trunfo de Rodriguez, a persistência quase lunática com que foi introduzindo momentos que nos atiram para uma sala bafienta de uma Nova Iorque esquecida. Bobines perdidas, chuva na gravação, má fotografia, má direcção de actores, más intérpretes, constantes e desnecessários grandes planos de voluptuosos seios, James Dean’s de aldeia com tiradas batidas e muito, muito sangue. Isto é um pouco do que podemos ver nesta segunda parte de Grindhouse. Tudo recheado de zombies, de uma visão machista e conservadora e de um humor que tem tanto de bárbaro (na essência) como de refinado (na ironia).

Para um público fiel talvez tudo isto fossem argumentos de peso, mas o objectivo de Rodriguez era trazer o género para o grande público. Para isso, nada melhor que uma mão cheia de actores de renome. Rose McGowan é a estrela da companhia, tal como em Á prova de morte (e até aí, nos variados actores que se repetem entre os dois filmes, a dupla de realizadores foi fiel ao género), Freddy Rodriguez (o Rico, de Sete Palmos de Terra), Bruce Willis, Naveen Andrews (que muitos conhecerão como Sayid) ou próprio Tarantino são as principais cabeças de cartaz. Quanto à história, bem, formule um pouco à volta da palavra zombie e não andará, de certo, muito longe. Nunca tal se disse com tanto agrado, mas fique certo de esquecer eventualmente este filme. Sem nunca esquecer uma tal perna. Até aí, Rodriguez, até aí.

Título: Planeta Terror
Realizador: Robert Rodriguez
Elenco: Freddy Rodríguez, Rose McGowan, Josh Brolin, Michael Biehn, Naveen Andrews, Michael Parks, Electra Avellan, Elise Avellan, Quentin Tarantino, Bruce Willis
E.U.A., 2007.

Nota: 7/10

2 comentários:

B. disse...

Gostava que comentasses o "Death Proof".

Quanto a este, dou-lhe quase tudo o que dizes, no que toca à fidelidade de não fazer um bom filme, mas sim de fazer um "avacalho" sobre os filmes de série-z da altura.

No entanto, acho que o filme é mesmo isso mesmo, um puro "avacalho" e com pouca coisa boa, embora ideias, tenha umas bem engraçadas.

Seja como for, repito, dou o valor da coerência.

O "Death Proof" é de uma fase dos filmes grindhouse, mais ligadas aos carros e às mulheres volumptuosas, o do Rodriguez (realizador bastante abaixo da média na minha opinião, que tem o Sin City, com a ajuda do Frank Miller, e nada mais acima da média) é ligado à fase gore...

O "Death Proof" é uma prova que, mesmo tentando, o Tarantino não sabe filmar mal, não sabe escrever mal, não sabe ter maus diálogos, nem sabe ter pouca pinta nos filmes que faz, ou seja, mesmo a brincar, fez um bom filme, daqueles que saímos de lá de barriga cheia...

O Rodriguez não, agora, quanto ao projecto deles, será que o Rodriguez fez mais o que era suposto, do que o Tarantino? Sim, talvez, mas em termos de cinema, acho que são de campeonatos totalmente diferentes, com distâncias tão claras como a capacidade individual de cada um dos realizadores.

Gustavo Jesus disse...

Concordo em quase tudo contigo. Concordo que o Tarantino e o Rodriguez são de campeonatos diferentes, até porque sou um fã confesso e indefectível de Tarantino, quer enquanto critico quer mesmo como artista.

E mesmo neste caso, como filmes isolados, talvez até prefira Death Proof como objecto artistico porque, como dizes, Tarantino não sabe filmar mal.

Mas o que Rodriguez conseguiu atingir com o seu Planet Terror é de uma fidelidade ao seu propósito inicial e ao género que homenageia que não consigo deixar de o preferir. Ainda que o seu filme me agrade menos.