segunda-feira, 11 de fevereiro de 2008

Vista Pela Última Vez

Do pouco que permanecerá quando a poeira de todo o aparato maddiano acentar, será uma triste imagem de uma comunidade humana sequiosa de pormenores voyeuristas, de sentimentos fáceis e instáveis, constantemente à procura de mais uma acendalha com que cozer o lume brando em que tudo se tornou. A isto, junta-se o circo de imprensa, a cobertura anti-noticiosa e exploradora, que em tudo confirma o pobre retrato social que a fotografia geral sugere. Aqui, e apenas aqui, se descobrem pontos de contacto entre a história de Maddie e a de Amanda, a miúda raptada no filme de Ben Affleck que agora chega às salas portuguesas, Vista Pela Última Vez. Tudo o resto são subterfúgios circunstanciais que o próprio circo voyeurista fez questão de explorar.

Poderia bem ser que Vista Pela Última Vez fosse um caso Eastwoodiano de transformação artística. Poderia bem ser a oportunidade de Affleck se desligar da imagem de actor medíocre para embarcar na carreira de realizador socialmente activista. Vista Pela Última Vez poderia bem ser um grande filme. Mas não é. Há alguns lampejos de um caminho que se pretende seguir mas, um pouco à semelhança do que acontece com a sua carreira de actor, o principal problema de Affleck parece residir nas más escolhas. Há vários temas que Affleck aborda superficialmente, deixando escapar a hipótese de um filme memorável para um policial banalíssimo que se esconde por trás do peso que o tema de base inspira.

Casey Affleck, o irmão de Ben, é um detective privado que, com a sua companheira, se vê contratado para procurar uma pequena rapariga raptada. Tudo se desenrola em tom morno mas rápido, com a cidade de Bóston como pano de fundo, entre o policial banal do cinema americano e os toques de realismo modernos na história da pedofilia moderna e da luta contra ela. Ben filma bem e seguro, mas parece não saber bem o que quer realmente dizer. Casey prova que nem só de mau actores vive a família Affleck e assume-se como um dos mais promissores actores de 2007. Morgan Freeman e Ed Harris são um piloto automático, sem nada de novo, mas sem nada de mal.

Tudo seria melhor se Ben Affleck se debruçasse sobre os 10 minutos do filme. Somos conduzidos durante todo o filme para um culminar de reviravoltas que, não sendo novidade nem surpresa, colocam sobre o peso da personagem o peso de uma decisão impossível. Uma decisão que não pode deixar de tomar, ainda que a saiba errada. Uma decisão onde é impossível não sair a perder. É este o ponto forte de Vista Pela Última Vez, o desnorte pessoal que uma decisão errada, ainda que seja a certa, provoca. Affleck não ter sabido seguir por aí não chega a ser uma surpresa.

Título: Vista Pela Última Vez
Realizador: Ben Affleck
Elenco: Casey Affleck, Ed Harris, Morgan Freeman, Michelle Monaghan, Amy Ryan, John Ashton e Robert Wahlberg
E.U.A., 2007.

Nota: 6/10

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