domingo, 27 de setembro de 2009

Distrito 9


O que se espera de um filme de ficção cientifica é que caminhe na linha ténue onde se encontra o falso entretenimento com a metáfora, normalmente social. Falso entretenimento porque apenas na aparência a ficção cientifica é um género de entretenimento. Não é. É um espaço de criatividade e de imaginação, mas que quase sempre teve um grande componente de reflexão sobre o seu tempo. Dos únicos espaços onde a capacidade de criar apartir de um cenário não tem limites, porque se rege por diferentes regras. O problema é que o componente da reflexão tem vindo a perder-se. O que parece interessar à ficção cientifica de hoje é que um extra-terrestre de ar agressivo queira invadir o planeta para criar cenários bélicos. Depois juntamos um actor-heroí-vedeta, atafulhamos tudo de fantásticas cenas de pancadaria, polimos com espectaculares efeitos especiais e acabamos em grande, com o heroí a casa retornado após salvar, uma vez mais o mundo. O mundo já foi salvo, aparentemente, algumas largas centenas de vezes. E, contudo, ainda aqui estamos, no mesmo sítio. O problema desta ficção cientifica espectáculo é que raramente corre atrás de alguma coisa. Simplesmente corre - e quase sempre corre, literalmente, porque o ritmo é demasiado frenético para sequer deixar pensar. Depois do filme feito e colado, alguma espécie de conotação com a sociedade se há-de aplicar. Desde o 11 de Setembro, tudo é mais fácil. Qualquer alien é um terrorista e metáfora desenrola-se por aí fora nesse sentido nas várias entrevistas propagandistas que antecedem o lançamento do filme.
Daí que seja refrescante depararmo-nos com um filme do género que foi pensado antes de ser feito. Que foi feito porque se tinha algo a dizer e não só porque havia dinheiro a ser ganho. Com produção de Peter Jackson, Distrito 9 é a história de um grupo de extraterrestres que se vêem atracados em Joanesburgo e depois segregados pela população, até acabarem num bairro marginal, o Distrito 9. Tratados desumanamente, por não serem considerados humanos, estes seres são deixados a viver nas condições mais degradantes, numa zona que evolui rapidamente para a pobreza, a decadência, a prostituição, a violência e o isolamento. Até que um homem, um funcionário do sistema, se vê envolvido numa mutação que o torna meio humano meio alien. Ficção aparte, o que aqui interessa, após isto - e isto, o até agora, é o melhor do filme - é a ruptura deste homem com o seu mundo anterior, a forma como este o persegue e a denúncia das associações internacionais como sedes de corrupção. Distrito 9 é ao mesmo tempo uma reflexão sobre o racismo e sobre o Apartheid, não sendo a isso alheio o facto de se localizar em Joanesburgo e ser filmado por um natural da África do Sul. Mas é também mais que isso. É um filme sobre a segregação social, sobre o arranjamento urbano de classes e de raças que leva, indubitavelmente, a um efeito cumulatório de violência, exploração e pobreza. Até aqui é a parte em que Distrito 9 é um bom filme, na teoria. Na prática, nada resulta muito bem. O arranjo engraçado em forma de documentário é original mas não esconde as lacunas do filme. A personagem principal não convence nem como humano nem como mutante, os aliens idem, há uma qualquer contradição entre a seriedade do filme e um lado naif que por vezes pontua e, como se não bastasse, acabamos o filme com a sensação de ter entrado na sala errada e ver uma qualquer versão de Transformers. O problema da ficção cientifica é quando esquece a ciência, não se agarra à ficção e fica convencida que é um filme de acção.
Título: Distrito 9
Realizador: Neill Blomkamp
Elenco: Jason Cope, Robert Hobbs, William Allen Young e Sharlto Copley.
E.U.A. e Nova Zelândia, 2009.
Nota: 5/10

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