terça-feira, 10 de março de 2009

Milk


Estranha carreira a de Gus Van Sant, quando se diz de Milk que é um filme convencional e mainstream. Vendo bem, no meio de Last Days, Elephant ou Paranoid Park, Milk parece ligeiramente mais contido. Ainda assim, não deixa de ser estranho que um filme activista sobre o movimento gay na América dos anos 70 seja apelidado de convencional. Nem na forma, nem no conteúdo. No conteúdo, por muito que Brokeback Mountain tenha aparentemente trazido o romance homossexual para a ribalta, o filme era mesmo isso, um romance. Não só não era grande filme - a novidade do romance era exclusivamente essa, a da homossexualidade - como não era um filme que nos falasse profundamente, quer da homossexualidade quer da discriminação. Na forma, vemos um filme falsamente contado apartir do fim, com uma narrativa autobiográfica de um milk que sabemos morto desde o princípio. De forma inteligente, Gus Van Sant joga esse trunfo da não surpresa logo no início. Como que dizendo, "Sim, ele foi morto. Agora podemos concentrar-nos no que interessa?"

A diferença sempre foi tema central no cinema de Gus Van Sant. Mas o que encontramos em Milk de mais parecido, tematicamente, com os seus anteriores filmes, é a força motriz de de Harvey Milk, que o impele a lutar contra o estabelecido. Em muitos dos filmes de Gus Van Sant vemos uma sociedade adormecida e estagnada e as suas personagens vivem aí mergulhadas. Harvey Milk teve a força suficiente para dizer que não. Primeiro a uma vida mecanizada e depois à discriminação sexual de que era alvo. A diferença deste Gus Van Sant é que parece mais parcial do que nunca - o que não é uma crítica. Gus Van Sant, quase por definição, mostra. Não julga. Milk fala de um personagem que percebemos querida ao realizador e para a qual canalizamos as atenções e os afectos. É raro uma personagem de um filme de Gus Van Sant ser tão nitidamente o heroí, pelo qual e com o qual se sofre.
Mas nada disto, na maior parte do tempo, interessa. O que interessa é Sean Penn - parece fácil dizer isto depois dos óscares, mas não é por isso que se torna mais óbvio agora do que antes. Não é só à luz da construção de Harvey Milk que se julga o desempenho de Penn - porque fazer um biopic, que o diga Seymour-Hoffman, parece ser meio caminho para um óscar. É quando nos lembramos de I am Sam e de Mystic River que percebemos que não é assim tão difícil encontrar um bom actor. Difícil é encontrar um actor versátil, que seja igualmente bom em todos os campos. Sean Penn constroí verdadeiras personagens e, se a capacidade de nos emocionar não é recente, a permissa de abandonar a imagem de heterrossexual que lhe assiste é. Se mais nada houvesse, Sean Penn bastaria.

Título: Milk
Realizador: Gus Van Sant
Elenco: Sean Penn, Emile Hirsch, Josh Brolin e James Franco.
E.U.A., 2009.

Nota: 7/10

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